London Calling Número 15
Na virada do milênio!
Oi moçada! Na contagem regressiva para o ano 2000 parece que os relógios até estão andando mais rápido. O ano passou e eu nem vi! Einstein estava certo pois, o tempo é relativo mesmo! O Natal aqui passou chuvoso, frio e o inverno bravo só serviu para aumentar o sentimento de nostalgia e saudades em todos aqueles que estão distantes de seus países de origem, familiares e amigos. Eu, como muita gente, olhei para trás e relembrei os fatos mais importantes do ano.
Desde que eu cheguei aqui em 87, fui privilegiado em poder observar mais de perto fatos históricos tão importantes como, a queda do Muro de Berlim, a fragmentação da União Soviética, o fim político da Margaret Tatcher e depois a derrocada do seu Partido Conservador. Neste ano que se passou nada me deu mais satisfação do que ver até que enfim o Pinochet sentir o que é ser reprimido e confinado; o karma demora mas chega. Por outro lado, infelizmente o efeito "dominó" do colapso da economia mundial aponta para tempos ainda mais difíceis para o povo do terceiro mundo porque quando as coisas vão mal nos países mais avançados sempre quem paga o pato são os países menos favorecidos.
Internacionalmente, na minha opinião, musicalmente 98 foi um ano fraco, onde apesar de termos ouvido bons trabalhos de bandas como Radiohead, Garbage e Slayer, nada realmente causou-me grande emoção. Nenhuma banda realmente fez algo significativamente novo ou mostrou algo que apontasse para uma saída para a mesmice do mercado fonográfico. Agora, já em termos de presença brasileira aqui em Londres a coisa foi boa com três excelentes shows: Ratos de Porão, Sepultura (numa dobradinha explosiva com Slayer) e Drugstore (com a brasileira Isabel Monteiro no baixo e vocais).
Como acontece já há vários anos, o "escritório" da Dynamite aqui em Londres recebeu a visita de muitos músicos: Retturn, Muzzarelas, o baixista Coquinho, Delph, Zeitgeist Co., Eminence, Sufrágio, The Forest, Hammer of Gods e Tropa de Shock. Recebi também a visita do baterista da banda chilena Dogma e o produtor brasileiro Jodele Lacher. Recebi também dezenas e dezenas de CDs de bandas brasileiras tentando a sorte. O último CD chegou em dezembro e foi da banda Megahertz vindo de Teresina (Pl). A banda faz um thrash pesadíssimo com boas idéias, um diamante bruto que ainda precisa de um pouco de lapidação. Para todos aqueles que mandaram material para mim e para outras revistas meu conselho é: Não liguem para as críticas negativas de ninguém. O mais importante, é vocês estarem satisfeitos com o seu trabalho. Mesmo que nada aconteça, quando vocês ficarem velhos, vocês estarão com a consciência tranqüila e a maturidade de quem esforçou-se e tentou. Se não rolou foi por motivos fora do seu poder de controle...
Ainda falando de Brasil, o Adolfo da banda Eminence que esteve em fevereiro 98 junto comigo no Dynamo Open Air Festival, voltou ao Brasil para retornar em novembro com toda a banda e fazer vários shows pela Europa. Por outro lado o Don (vocal) e a Katia (empresária) da banda Tropa de Shock estiveram de passagem por aqui onde teriam escalas em vários países inclusive com coletivas de imprensa já armadas. Curioso ver bandas relativamente desconhecidas no Brasil recebendo tratamento tão respeitoso da imprensa internacional. O mesmo aconteceu com a banda Delpht onde o repórter de um programa de rádio alemão ligou-me várias vezes buscando entrevistar a banda e só sossegou depois que eu acertei tudo. De qualquer forma acho a banda mais afortunada foi o Zeitgeist Co. de Curitiba que, aparentemente, conseguiu assinar com o selo DSFA da Holanda.
A small big woman
O show do Drugstore foi muito bom. Aconteceu no Astoria II no dia 12 de dezembro com a casa lotada. Eu tinha entrevistado, por telefone, a vocalista alguns meses antes mas, nunca a tinha visto em ação, Isabel Monteiro é uma garota (não tão garota) bem pequena que com uma sensualidade toda sua, explora muito bem o mito da sexualidade brasileira e comanda uma banda de homens como se tivesse um chicote na mão. Ela tratava os caras como leões amestrados de circo e à vista de todos. Não sei se ela poderia fazer o mesmo com uma banda de músicos sul-americanos. O seu poder vocal não deixa dúvida quanto a sua competência e o público presente ovacionava qualquer coisa que ela fizesse. Quanto ela tocou a música El President, antes ela tomou um bom gole de vinho na boca da garrafa e dedicou ironicamente ao Pinochet, e quando ela cantou a música The Devil (O Diabo) ela mostrou uma foto do Pinochet que foi amassada e jogada na platéia... Sua posição contra o ex-ditador chileno já era conhecida uma vez que durante a semana ela e toda a banda apareceram na TV protestando em frente do hospital onde o "assassino" estava hospitalizado.
Beck & Tom Zé
O jornal The Guardian no seu caderno de arte de 4 de dezembro dedicou toda uma página ao músico Tom Zé que acaba de lançar seu álbum Com Defeito de Fabricação através do selo Luaka Bop do, ex-Talking Heads, David Byrne.
Jonathan Romney, o jornalsita do The Guardian, compara a loucura do músico brasileiro com Beck que no seu novo álbum Mutations redescobre a música brasileira do começo dos anos 70 e até presta uma homenagem à Tropicália. Enquanto músicos daquele período tais como Caetano e Gil tornaram-se nomes conhecidos no mundo todo Tom Zé ficou esquecido e só foi redescoberto quando David Byrne o incluiu numa coletânea em 1990.
|