O sarau do Caca, Romeu "Begher" Bienvenutti ou como consegui meu primeiro violão Fender
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O sarau do Caca ou como consegui meu primeiro violão Fender
Escrito por Antonio Celso Barbieri
Como tudo começou
Entre muitas atividades, também dou assistência técnica para computadores Macintosh e, com divulgação feita apenas de boca-a-boca, ao longo dos anos acabei criando uma clientela formada quase que só por músicos ou profissionais em várias áreas das artes.
Um dia visitei um cliente para reformatar o disco rígido do seu computador. Reformatar um disco rígido é um trabalho demorado que pode levar quase o dia inteiro porque, geralmente significa também reinstalar o OS (Sistema Operacional) e todas as aplicações (programas). A verdade é que, depois de ter feito centenas e centenas de vezes, este mesmo serviço, garanto-lhes que não existe trabalho mais tedioso e enfadonho.
O lado interessante do trabalho é visitar ingleses em suas casas, exercitar o uso da língua inglesa, saber o que fazem e sempre aprender alguma coisa no processo.
Neste dia em particular, estava na casa de um senhor que editava vídeos. Enquanto trabalhava no seu computador, ele perguntou-me se não me importava em ficar por algumas horas trabalhando sozinho ali na sua casa pois, ele tinha que fazer uma visita ao seu escritório para pegar um equipamento.
Fiquei então à sós no seu apartamento. Reformatei o disco rígido e, depois, quando comecei instalar o Sistema Operacional, na tela do computador abriu-se uma "barra de progressão" com uma mensagem dizendo que aquela tarefa levaria mais de 45 minutos para concluir-se.
Sozinho, sem nada mais para fazer pelos próximos 45 minutos, da cadeira giratória dei uma virada e observei a sala. Como sempre, o que vi foi o "caos organizado" das pessoas envolvidas em criação. Olhei para o sofazão velho exatamente à minha frente e, imediatamente a minha atenção foi despertada por algo que parecia ser a ponta de um cabo de violão acústico despontando por debaixo do sofá.
Saí da minha cadeira e fui observar o achado mais de perto. Ali, abandonado, todo sujo e empoeirado, descansava um violão, de bruço, diretamente sobre o velho carpete. Puxei o mesmo para fora e examinei-o. Era um violão Fender aparentemente muito velho, sem cordas e descuidado. Nem preciso lhes dizer que, quiz "adota-lo" imediatamente!
Coloquei-o cuidadosamente novamente de volta na posição original e esperei o dono retornar.
Quando ele chegou, depois de algum tempo, durante um bate-papo, enquanto instalava os programas, casualmente perguntei-lhe se ele tocava algum instrumento. Ele respondeu que sim e, sorrindo, perguntou-me como é que tinha adivinhado. Apontei para o braço do violão saindo debaixo do sofá.
"Há, aquele violão era uma porcaria, não segurava a afinação! Bom é este aqui…" E, abrindo a porta de um armário, tirou um estojo enorme, abriu-o e mostrou-me um lindo violão Yamaha novinho. Daí, olhou com desdenho para o violão Fender e disse:
"Está interessado nele? Podemos fazer um rolo! Vou ter que te pagar 100 Libras mesmo, quanto é que você me dá pelo Fender?"
Mostrando total desinteresse respondi:
"Ele está muito usado, não pago mais do que 20 libras!"
"Negócio fechado!" Foi sua resposta. Concordei apenas com um aceno a cabeça.
Quando cheguei em casa com o violão, fui cuidar do "bichinho". Olhei dentro do mesmo e vi que tinha um selo da Fender indicando o modelo. Trata-se de um Fender Modelo F-03. Chequei na Internet e descobri que o mesmo tinha sido produzido lá pelo meio dos anos 70. Pesquisando um pouco mais descobri alguém sugerindo que o mesmo vale umas 2.000 libras! (cheque aqui)
Romeu "Begher" Bienvenutti. Acreditem-me este homem é uma lenda!
Quando coloquei as cordas percebi que o violão trastejava um pouco e estava precisando de uma atenção especial.
Meses depois, recebi a visita de Marco Antonio Mallagoli o responsável pelo Fan Club Revolution. O Revolution é sediado em São Paulo e é considerado por muita gente como sendo o maior fã clube dos Beatles da América Latina. Conheço Marco Antonio por mais de 30 anos e quando ele visitou-me mostrei-lhe o "meu tesouro" Fender. Ele disse que conhecia Romeu, irmão do Nenê que foi baixista dos Incríveis. Romeu tem uma fábrica de guitarras desde os anos 60 chamada "Begher" que, segundo Marco me disse, foi a primeira a construir uma guitarra estéreo no mundo, antes mesmo da Rickanbacker alemã. Disse que Romeu mora em Pinheiros e era a pessoa certa para checar o meu violão.
Uns poucos dias antes de Marco viajar de volta para São Paulo ele insistiu em levar o violão com ele. Como também estaria em breve viajando para SP aceitei. Umas duas semanas depois da minha chegada recebi de volta o violão Fender "calibrado" e com um som maravilhoso. Romeu fez um serviço fantástico! (O som que vocês já devem estar ouvindo neste momento)
Vejam abaixo estes dois vídeos obrigatórios sobre Romeu Bienvenutti, esta pessoa muito especial e, como disse acima, uma lenda da guitarra no Brasil!
Uma raríssima guitarra Begher toda banhada à ouro!
Carlos Alberto Zanarotti (Caca) feliz ao violão.
No final das minhas férias brasileiras, um pouco antes de voltar para Londres recebi a visita do meu amigo Carlos Alberto Zanarotti mais conhecido como Caca. Caca foi meu padrinho de casamento, é fanático por bossa-nova e é fã de carteirinha do João Gilberto. Eu não gosto de bossa-nova e muito menos do João Gilberto!
Sempre achei bossa-nova uma música chata e elitista que, perto do rock, é tão fria quanto o sangue dos peixes. Bom, sempre que nos encontramos trocamos umas "farpas" musicais irônicas e damos muitas risadas um do outro! :-)
Carlos Alberto Zanarotti fazendo uma careta enquanto sola. Este não nasceu para ser roqueiro! :-)
Sabendo que Caca é músico, coloquei o Fender nas mãos dele. Já fazia um tempinho que ele não tocava e portanto estava um pouco "enferrujado" mas, de qualquer forma, mesmo contra a vontade dele, aproveitei o momento e liguei meu gravador digital para registrar a ocasião. Caca é uma figura muito agradável e nosso encontro foi muito divertido. Espero que vocês também gostem do "Sarau do Caca"! :-)
Quanto ao violão, ele foi adotado aqui pelo Barbieri e enquanto eu viver nunca mais será vendido! :-)
Antonio Celso Barbieri