Luiz Domingues: Uma entrevista com o veterano músico paulista
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Luiz Domingues
Luiz Domingues: Uma entrevista com o veterano músico paulista
Escrito por Samalio. Publicado na Coluna Música Para Viver em Dezembro de 2013.
O rock de São Paulo é sem dúvidas uma referência do rock brasileiro para o exterior, e foi em São Paulo que surgiram várias lendas do rock clássico como Made in Brazil, Patrulha do Espaço, Pedra, Os Kurandeiros, Mutantes, Titãs etc. Sem contar dos nomes como Rita Lee, Arnaldo Baptista, Cornélius “Lúcifer”, Oswaldo Vecchione, Nando Reis etc. A Coluna Música Para Se Viver do Linkself tem o prazer de entrevistar um destes veteranos do rock nacional, o Luiz Domingues, baixista que já tocou junto com grandes bandas como o Patrulha do Espaço e atualmente toca em três projetos como o Kim Kehl e os Kurandeiros, Ciro Pessoa e a banda Pedra. Este cara cheio de rock e blues em suas veias é com toda certeza mais um dos destaques do rock de pura qualidade, e que ainda algumas pessoas não o conhecem, mas nossa coluna musical tem o prazer de apresentar suas expressões e ideias para aqueles que são sedentos pela informação e claro, pelo bom e velho, Rock and Roll.
LINKSELF: Entre Os Kurandeiros e Pedra, quais são as influências em comum? (Músicas, bandas tipo de música).
Luiz Domingues: Bem, não obstante o fato de existirem muitas raízes em comum, o trabalho dos Kurandeiros e do Pedra tem características distintas. Com os Kurandeiros, o bojo do trabalho é o Blues-Rock, onde o Blues tradicional e o Rock'n Roll transitam com pitadas de R'n'B, Soul, Folk e Country-Music. Já no Pedra, o Blues e o Rock'n Roll tradicionais não são tão predominantes, mas existe uma maior aproximação com o Rock Progressivo e o Hard-Rock setentistas, além da psicodelia sessentista. O Folk americano e europeu tem uma representação mais discreta, mas o Folk brasileiro, sim, é proeminente, via música de raiz. É clara também a influência que temos da MPB, principalmente da década de sessenta, além da Black Music americana. O Soul/Funk/ R'N'B da Motown e Stax, faz nossas cabeças. Prefiro não falar sobre artistas que curto, pois ocuparia a entrevista inteira...
LINKSELF: Em uma outra entrevista, Rodrigo Hid da banda Pedra afirmou que tanto ele quanto você curtem o URIAH HEEP e que tiveram a oportunidade de abrir um show para eles em um festival em 2006. Como foi a experiência de tocar com eles?
Luiz Domingues: Foi fantástico abrir o Uriah Heep, que sem dúvida é uma das bandas setentistas que mais gosto pela riqueza melódica, sobretudo. O convívio com eles nos bastidores foi discreto, mas amigável e o guitarrista Mick Box foi o mais acessível, inclusive trocando ideias com o Xando Zupo, falando sobre as respectivas pedaleiras que usavam. O roadie do Mick Box curtiu muito o nosso som e comparou o Rodrigo ao Ken Hensley, pela versatilidade de ser também um guitarrista e tecladista, simultaneamente. Inclusive o Rodrigo Hid ajudou os roadies no soundcheck do Uriah Heep, tocando o orgão Hammond, executando "Rainbow Demon", que lhes arrancou sorrisos de satisfação.
LINKSELF: O que/quem fez você se interessar tocar baixo?
Luiz Domingues: Não sou nenhum fanático pelo instrumento que toco. Eu era um adolescente obcecado pelo Rock na década de setenta, e quis entrar para esse mundo a todo custo. Sem saber tocar nenhum instrumento, não tinha nenhuma atração especial pelo baixo, mas ansiava tocar numa banda de Rock. Se pudesse escolher, provavelmente teria sido baterista, instrumento que mais simpatizo, mas a primeira oportunidade que surgiu para fazer parte de uma banda de Rock, foi como baixista, e daí, agarrei a chance e fui aprendendo a tocar esse instrumento.
LINKSELF: Atualmente você também faz parte da banda de apoio de Ciro Pessoa ex-integrante do Titãs, você acha que ele ainda carrega alguma herança trazida por seu curto tempo nos Titãs?
Luiz Domingues: Sim, estou na banda de apoio do Ciro Pessoa e curto muito o trabalho solo dele, que é 100% influenciado pela psicodelia sessentista. Tocar com ele, é como estar no Pink Floyd da fase Syd Barrett e me divirto muito com essa loucura psicodélica. Claro, tocamos algum material das bandas de proposta Pós-Punk pelas quais ele passou, como Titãs e Cabine C, mas o bojo do trabalho dele é a psicodelia sessentista, com doses maciças de surrealismo, via Dali, Magritte, Buñuel etc.
LINKSELF: Você acredita que estas bandas de hard rock, blues e metal de São Paulo como o Patrulha do Espaço, o Made in Brazil, Pedra etc, são exemplos de que estes tipos de música dão certo sim, sendo cantadas em português apesar de que muitos falam que rock não soa bem em nossa língua?
Luiz Domingues: Acredito que um artista que estabeleça um idioma estrangeiro para expressar-se é porque almeja o mercado internacional como estratégia de carreira. Se vivemos no Brasil, e o objetivo é atingir o mercado interno tão somente, não faz sentido fazer uso de uma lingua que não seja o português. No caso do Pedra, isso ganha uma importância ainda maior, pois existe um esmero para escrever letras que avancem além poesia em si. A preocupação em expressar imagens e temáticas mais profundas é fruto do nosso apreço à MPB 60/70, onde havia esse requinte, e queremos resgatar isso como valor agregado em nossa música.
LINKSELF: Quando você e mais outros dois integrantes do Patrulha do Espaço saíram da banda consequentemente vocês já tinham outro projeto em mente, sendo que mais tarde formaram a banda Pedra?
Luiz Domingues: Minha saída da Patrulha do Espaço em 2004, foi por fatores pessoais tão somente. Pensava em dar um tempo, talvez até em encerrar a carreira naquele instante, portanto, não foi premeditada a minha entrada no Pedra. Pelo contrário, coincidiu que o guitarrista Xando Zupo estivesse montando um novo trabalho e interessou-se na minha participação quando soube que eu estava disponível. Quanto ao Rodrigo Hid, foi praticamente igual. Ele deixou a Patrulha pois desejava gravar um CD solo, mas aceitou entrar no Pedra algum tempo depois, também convidado por Xando Zupo.
LINKSELF: O rock de São Paulo é encarado como o “rock de verdade” que temos no Brasil?
Luiz Domingues: Quando eu era adolecente, nos anos 70, São Paulo era sinônimo de Rock. As próprias características sócio-culturais da cidade, e até climáticas, por incrível que pareça, favoreciam esse panorama. Sem belezas naturais, fria e sob a garoa gelada e diária, a metrópole mais se aproximava de Nova York e Londres, do que uma cidade sulamericana e tropical. Mas tudo foi mudando radicalmente e acredito que a cidade perdeu o seu apelo Rocker. É claro que ainda tem seus focos, mas a dispersão é muito grande hoje em dia. Morei na Vila Pompéia, bairro da zona oeste da cidade, em 1966-1967. Mesmo sendo criança, minha lembrança é nítida : não havia um quarteirão sequer do bairro, onde não houvesse ao menos uma banda ensaiando numa garagem, aos sábados pelo período da tarde. Era caminhar pelas paralelas e transversais da Avenida Pompéia e ouvir Beatles, Stones, Kinks por todos os lados... Aí sim, era uma cidade rocker.
LINKSELF: Você há muito tempo é um veterano do rock em São Paulo, você já chegou a tocar com outras referências do rock paulistano como Rita Lee, Percy Weiss, Cornélius “Lúcifer”, Oswaldo Vecchione, Arnaldo Baptista etc?
Luiz Domingues: Conheço pessoalmente todos esses artistas que citou, mas só toquei com o Percy Weiss. Ele foi o primeiro vocalista da Chave do Sol, minha banda nos anos oitenta, além de participações especiais dele com A Patrulha do Espaço em algumas ocasiões no anos 2000, quando eu era membro da banda. Mas já toquei muitas vezes com o Luiz Carlini, Marinho Thomaz, César de Mercês e Franklin Paolillo, igualmente feras do Rock brasuca setentista.
LINKSELF: Sem Elvis, Jerry Lee Lewis, Chuck Berry, Janis Joplin o rock (incluindo o de São Paulo) seria o mesmo?
LUIZ DOMINGUES: Acredito que sem esses astros cinquentistas que citou, não teria havido nem Janis Joplin, quanto mais a produção brasuca. Particularmente, reverencio esses desbravadores geniais da década de cinquenta, que difundiram a improvável mistura do Blues dos negros, com o country dos brancos e daí, ter precipitado o Rock, fruto dessa mistura explosiva e revolucionária.
LINKSELF: Quais são suas atuais metas e objetivos?
LUIZ DOMINGUES: A meta é a de sempre, desde 1976: fazer música. Paralelamente, gosto de escrever e nesse sentido, tenho dois blogs pessoais e sou colaborador de outros blogs de amigos meus.
LINKSELF: E quais seriam estes blogs?
LUIZ DOMINGUES: Meu Blog nº 1, onde reúno todos os textos que escrevo, alguns exclusivos para ele, mas também os que já foram lançados nos blogs de amigos. No Blog nº 2, tenho quatro colunistas que colaboram comigo, escrevo alguma coisa alternativa e estou publicando aos poucos, a minha autobiografia na música. No Planett Polêmica, do Eduardo Sandoval, escrevo quinzenalmente. Geralmente sobre política, sociedade & comportamento, cidadania, ecologia & afins...
No Limonada Hippie dos amigos Márcio Reis e Fernanda Valente, escrevo geralmente sobre contracultura, anos 60 e cultura pop das décadas de 60 e 70.
No Site/Blog Orra Meu, a missão é falar de fatos e personagens sócio-culturais paulistas e paulistanos. E finalmente, no Site Rock Imortal, tenho falado sobre artistas desconhecidos, mas de talento, que tem pouco espaço na mídia mainstream.
LINKSELF: Para finalizar, chegamos ao natal e ano novo, uma mensagem de livre teor.
LUIZ DOMINGUES: Encaro natal e ano novo como marca de renovação. O momento é para refletir, corrigir a rota e tentar melhorar sempre.
Meu muito obrigado pela oportunidade da entrevista e um abraço!!
Luiz Domingues