Zé Brasil e o Movimento 70 de Novo
- Details
- Parent Category: ROOT
- Hits: 3912
O MOVIMENTO
Tenho novamente pensado muito num assunto em particular e gostaria que vocês refletissem sobre isso. Sou músico e produtor independente desde o início dos anos setenta. Todas as vezes que interagi ou tentei interagir, aqui no Brasil, com o show business oficial das majors (grandes gravadoras), das multinacionais, da direita tradicional e conservadora em última análise, não deu certo. Tive alguma experiência internacional nos Estados Unidos e na Europa e percebi que lá as coisas são diferentes. As majors se nutrem da criatividade das indies (gravadoras independentes), a ponto de, nos anos 80, o movimento independente ter salvo as grandes gravadoras da bancarrota. No fundo acho que o poder econômico tentou ou comprou o underground, mas os artistas ganharam com isso e o público também. Sempre tive esperança que isso acontecesse aqui no Brasil mas parece que a fronteira (tênue e quase impenetrável ao mesmo tempo) entre os indies e os majors continua impedindo a evolução da nossa cena musical.
Vejam o caso dos Mutantes: assim que conseguiram o apoio essencial decolaram para Londres e para o mundo. Na volta já foram apropriados pela Globo, Sony, etc, com resultados muito bons para eles e para os seus milhares de fans. Mas os Mutantes nunca foram independentes: desde o início mereceram e participaram dos grandes movimentos musicais (Festivais, Tropicália, etc) dos anos sessenta e com isso sempre desfrutaram do poder de penetração e influência da grande mídia, devidamente censurado e "permitido" pela ditadura. Esse poder é tão forte que, aliado à incrível qualidade musical dos Mutantes, fez com que os filhos e até netos dos seus fans originais cantem junto com eles as letras de quase 40 anos atrás. É maravilhoso isso num país tão desmemoriado como o nosso. Ao mesmo tempo alguns de vocês podem ter ouvido falar do Rock Brasileiro dos anos setenta. Existiram conjuntos como o Terço, o Som Nosso de Cada Dia, o Terreno Baldio, a Barca do Sol, o Vimana, o Veludo, o Bicho da Seda, a Bolha, o Peso, o Burmah, o Sindicato, a Chave, o meu Apokalypsis, e muitos outros, gente independente e talentosa que fazia um som inesquecível e surpreendente. Ao contrário do que aconteceu na Inglaterra e Estados Unidos, vieram os anos 80 e o Movimento acabou, assim com acabaram todas essas bandas.
Os músicos que conseguiram sobreviver se adaptaram ao modelito pop das grandes corporações e aquele som, mágico e incandescente, se perdeu no tempo. Quem teve oportunidade de ouvir nunca esqueceu o que seria a grande promessa de um Rock Brasileiro de qualidade universal. Enfim, este texto virou um desabafo e uma esperança. Sim, é uma esperança de ressurreicão, de reencarnação, de segunda chance para aquele sonho, para aqueles velhos rockeiros que estão aí até hoje, íntegros e musicalmente saudáveis.
Paz, amor e rock'n'roll!
Visite o blog do Apokalypsis: (clique aqui)
Barbieri comenta:
Aqueles que possuem o poder de fazer algo, esquecem que a função do Produtor Cultural é a de dar espaço para todos os segmentos artísticos e não fazer boicote ou criar panelas. Precisamos sempre ter em mente que, uma banda não é feita só de ensaios. Ela precisa tocar, fazer shows para crescer no palco, desenvolver-se profissionalmente e, só assim, poder amadurecer seu trabalho.
Infelizmente tudo que a imprensa (jornal, rádio e TV) brasileira fez durante todos este anos foi isolar, segmentar, e criar falsas idéias à respeito do rock e do Rock Brasileiro em particular. A verdade é que o Rock Brasileiro nunca foi tratado com o devido valor e respeito que merece. Talvez a TV Cultura foi, paradoxalmente, a única emissora que quando deu uma força para o Rock Brasileiro, o fez respeitosamente.
Alguns anos atrás, contava uma das minhas histórias roqueiras para um amigo. Ele, para minha surpresa, interrompeu-me dizendo que esta era a terceira vez que eu lhe contava este mesmo episódio de minha vida. Ele, ainda disse que eu vivia no passado, que eu estava me repetindo, vivendo de memórias nostálgicas e muitas vezes cheias de ressentimento. Disse que eu estava parecendo uma daquelas divas do passado revivendo várias vezes aqueles momentos de glória que, pensando bem não eram nem tão gloriosos assim...
70 de novo?
A pergunta é uma só: Seria possível recomeçar de novo?
Sinceramente, eu digo que, assim como não existe possibilidade de volta ao paraíso, não existe possibilidade da volta aos anos 70. Eu acho que precisamos canalizar nossos esforços de forma diferente, tendo uma visão holística, uma visão de todo. O que não podemos fazer é, criar uma panela dos velhos. Isto seria repetir os enganos do passado. A minha visão é de aglutinar o rock em todas as suas tendências. Os músicos da antiga tocando junto com os músicos novos e respeitando uns aos outros e aos novos estilos que surgiram e os que ainda estão por surgir. Ei sei, aceitar o novo não é fácil mas, viver só no passado ainda é pior!
Eu não quero ressuscitar os mortos! O que eu quero é fazer e também produzir a música de HOJE, sempre reconhecendo e, na medida do possível, incorporando a genialidade do passado de acordo com a minha habilidade e competência. No fundo, a questão não é fazer bem ou fazer mau... a questão é FAZER! O público que julgue! Desculpem-me mas, deixem a imprensa que se foda na sua santa ignorância e presunção!
Muita coisa boa aconteceu depois dos anos 70. Surgiram novas bandas de qualidade, novos estilos musicais e novos equipamentos. A Internet nos deu novas formas de distribuir a produção musical, divulgar eventos e propagar informação. Surgiram também novos processos de gravação de áudio e vídeo. Os custos diminuíram e agora podemos gravar nosso álbum em casa, etc, etc.
Realmente acho que devemos sair dos nossos velhos casulos, nos reinventar, usando o nosso talento, nossa experiência de muitos anos e toda esta tecnologia ao nosso dispor para construir uma nova realidade musical para o Brasil!
Bom, eu acredito que já estou, de alguma forma, com este site, com este texto, fazendo a minha parte e o caro leitor? E o companheiro, músico, produtor, jornalista, roqueiro simpatizante, etc, esta fazendo a sua parte?
Quando foi que você colocou uma banda brasileira em primeiro lugar? Quando foi que você devotou um pouco do seu tempo para ajudar uma das nossas banda? Quanfo foi que você comprou um disco de rock brasileiro? Quando foi que você usou o seu poder na imprensa para empurrar para frente o nosso rock sem bairrismo, imparcilamente e sem panelismo? Não precisa responder! Eu sei! Criticar é sempre mais fácil do que construir!
Do jeito que eu vejo, não adianta ficar jogando merda no ventilador ou ficar esperando que, um milagre aconteça e a imprensa acorde. Não vai acontecer!
A solução está nas nossas mãos! Vamos usar este espaço (e todos os outros disponíveis) para discutir um caminho viável para o Rock Brasileiro!
Aqui me despeço com uma singela poesia de minha autoria:
Barbieri no Hyde Park (Londres, verão, 2010). Foto: Andrea Falcao
Você se lembra
quando tivemos que dormir
na estação de trem?
coração aberto
olhos fechados
Nas praias desertas
Nos dias incertos
Usávamos jeans e
ouvíamos o rock da estrada
Nunca estávamos sozinhos
sempre juntinhos
Nos amamos e continuamos até hoje
Eu faria tudo de novo
Eu faria tudo de novo
Eu faria tudo de novo
com você