As Políticas de Batman
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As Políticas de Batman
escrito por Ian Dunt para Talking Politics (19/07/2012)
Traduzido por Antonio Celso Barbieri
Nota do Barbieri: Nestes tempos caóticos em que vivemos, cheios de guerras intermináveis e loucos matando gente inocente dentro de cinemas, não resisti a tentação de traduzir para os caros leitores este texto que me fez pensar, novamente, no poder que a media tem para doutrinar e controlar as pessoas.
As Polítcas de Batman
O pessoal da direita não é celebrado pela sua capacidade de lógica, mas mesmo no mais baixo das expectativas, o ataque que Rush Limbaugh fez ao novo filme Batman: O cavaleiro das Trevas Ressurge foi realmente estranho. O comentarista de rádio, um conservador que transmite para mais de 600 rádios norte americanas decidiu que o vilão do filme — um consumidor de drogas chamado Bane — foi construído para ajudar a campanha de Barack Obama. Seu nome, aparentemente, parece ser muito semelhante à Bain, a empresa de capital de risco de Mitt Romney, o candidato republicano à presidência dos Estados Unidos.
"Você acha que é acidental que, neste filme, o nome do realmente vicioso cuspidor de fogo, quatro-olhos ou o que seja, seja um vilão chamado Bane?" Rush Limbaugh gritou durante seu último show. "Então este vilão do mal no novo filme Batman é chamado Bane e, existe por aí uma discussão de que isto foi proposital e, que vai ou não influenciar os eleitores. A audiência no cinema será enorme. Muitas pessoas estão indo para ver este filme. E é um monte de gente sem cérebro, da área de entretenimento, uma multidão da cultura pop e, eles vão ouvir Bane no filme e associar com Bain."
Limbaugh nem se preocupou com o fato de que o personagem Bane foi criado nos anos 90 (por Chuck Dixon um escritor de quadrinhos conservador) ou que o filme começou à ser rodado uns dois anos antes da fase atual do ciclo das eleições nos Estado Unidos.
Muito embora, possa estar no final mais maluco do espectro, estes comentários da direita não são os únicos exemplos que comentaristas políticos encontraram nas aventuras e filmes do Batman. De certa forma, os próprios filmes pedem por isto. Bane parece chefiar um grupo de manifestantes urbanos, no estilo destes que ocupam os lugares. No trailer, Selina Kyle — alter-ego da Mulher Gato — pode ser ouvida sussurrando no ouvido de Bruce Wayne:
"É melhor você e seus amigos baterem forte porque quando ele baterem de volta, vocês todos vão se perguntar como foi que você nunca pensou que você poderia viver com tanto e deixar tão pouco para o resto de nós."
Os filmes anteriores, tão pouco esquivaram-se da ética política. Foi difícil evitar comparações com os debates sobre tortura acontecidos depois dos ataques às Torres Gêmeas em 11 de setembro quando, Batman agrediu Coringa em uma cela da prisão no filme Batman: O Cavaleiro das Trevas. Mais tarde no filme, ele organiza um sistema de vigilância de toda a cidade, o que faz com que o amigo e árbitro moral Lucias Fox o condene aleganto ser "muito poder" para um homem só. No final, Batman permite que ele o destrua.
A projeção de ideias políticas sutis e silenciosas no homem morcego, feitas pelo diretor Christopher Nolan não é nenhuma novidade. Super-heróis sempre foram particularmente abertos à interpretações políticas. Superman foi muitas vezes descrito como uma fantasia de poder, mas, a verdade é que ele é muito mais convincente como o grande patriota imigrante. Esta criação, em 1932, dos judeus norte americanos Jerry Siegel e Joe Shuster com, a destruição da terra natal do seu personagem e, o amor do personagem ao seu país de adoção parecem ser uma projeção dos sentimentos dos escritores sobre seu país e o desejo do imigrante em encaixar-se nesta nova sociedade. Com uma ironia cruel, que parece resumir o sonho americano em um microcosmo, DC comics — agora pertencente à media gigante Time Warner — comprou o personagem por somente 130 dólares. Nas décadas seguintes, o par de escritores e suas empresas lutam para serem devidamente recompensados pelo sucesso de Superman. As batalhas legais ainda continuam até hoje.
Sobre sua concorrente a DC Marvel, heróis como Homem Aranha e X-Men oferecem uma imagem mais de esquerda à aventura. Eles não vivem em mansões ou estações espaciais, mas em Nova York. Peter Parker especialmente lutou para sobreviver, enquanto que, os mutantes são párias, sem quaisquer conexões sociais com a sociedade em que vivem. Eles funcionavam muito bem como metáforas para qualquer grupo minoritário que você escolha para comentar, de homossexuais ao movimento dos direitos civis.
Sob qualquer avaliação política, Batman aparece como o sonho de qualquer pessoa da extrema direita. Ele é um bilionário que bate nas pessoas pobres da rua.
Grant Morrison é um escritor de quadrinhos escocês que tem tratado o personagem Batman nos últimos seis anos e conseguiu, no processo, ganhar um lugar na lista de honras do aniversário da rainha. Ele descreveu o personagem de forma direta: "Batman foi o último herói capitalista... um milionário que ventila sua fúria infantil nas classes criminosas das ordens inferiores." Ele "socará o crime até a sua extinção, um canalha por vez".
Afinal, apropriadamente, como deveria de se esperar para um capitalista, a luta de Batman contra o crime não se estende a delitos corporativos, aos bancos, especulação finaceira ou evasão fiscal. Só se aplica a gangues de rua, batedores de carteira, traficantes de drogas e os pobres. Morrison argumenta que a popularidade relativa dos heróis diz algo sobre a sociedade. Superman representado o otimismo e o socialismo do século XX e, agora que vivemos uma época voltada ao culto da riqueza e celebridade, nós voltamos para o arrojado e violento Bruce Wayne e, o Homem de Ferro, um playboy vendedor de armas cujo alter ego é Tony Stark.
Mas a direita não foi sempre assim apaixonada com o Cavaleiro das Trevas. Uma pergunta, acima de tudo, parecia incomodar os conservadores sobre o homem morcego: Que exatamente fazem Batman, Robin e seu fiel mordomo Alfred dentro da mansão deles?
Em 1954 no livro Sedução dos Inocentes, o psiquiatra alemão-americano Fredric Wertham advertiu que o personagem poderia corromper mentes infantis. "Histórias tipo Batman podem estimular em crianças fantasias homossexuais, fantasias que podem ser de natureza inconsciente," ele escreveu e continuou:
"Só alguém ignorante dos fundamentos da psiquiatria e da psicopatologia do sexo pode deixar de perceber uma sutil atmosfera de homoerotismo que permeia as aventuras de Batman e seu jovem amigo Robin".
Isso foi devastador. O livro desencadeou um clamor moral sobre quadrinhos que levou a reuniões na Comissão do Senado Norte Americano, a demonização dos títulos de terror e a criação do Comics Code Autoridade (CCA). Desde então e até muito recentemente, quadrinhos precisavam ser censurados para receberem um selo de aprovação - completo com declarações morais de que o bem deve prevalecer até o final da história - para poderem ser vendidos nas lojas.
Numa ironia do destino, o efeito do selo CCA levou quadrinhos à uma direção completamente estranha. Como os escritores eram incapazes de lidar com assuntos obscuros e chocantes, eles permitiram que suas histórias derivassem para o estranho, para mágica, abraçando as realidades alternativas, cachorros com super poderes e pequenas cidades presas em garrafas de vidro. Foi esta qualidade onírica, alucinógena, que os levou a ressoar tão profundamente com os movimentos de droga-induzidos da década de 60. Tudo porque Batman parecia um pouco gay.
Esta é a estranha contradição na figura do Batman. Ele luta para preservar o "status quo", mas ele é inevitavelmente mágico, estranho e alucinatório. É por isso que figuras de todo o espectro político e social podem projetar ideias nele e, é justamente por isto que ele é um dos definitivos fenômenos culturais de nosso tempo.