Primavera nos Dentes: Banda lança álbum antológico! Será um novo Secos & Molhados para o Século XXI?
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A Banda Primavera nso Dentes.
Primavera nos Dentes
Banda lança álbum antológico!
Será um novo Secos & Molhados para o Século XXI?
Em agosto de 1973, o grupo Secos & Molhados - um dos mais importantes da música brasileira dos anos 70 - lançava seu primeiro disco homônimo. Exatos 44 anos depois, Charles Gavin, Duda Brack, Pedro Coelho, Paulo Rafael e Felipe Ventura divulgam, em todas as plataformas digitais e em vinil, o álbum Primavera nos Dentes. O trabalho, lançado pela gravadora Deck, conta com releituras de 11 das 26 canções lançadas pelo trio durante a fase inicial do grupo (1973 a 1974), na época formado por João Ricardo (vocais, violão e harmônica), Ney Matogrosso (vocais) e Gérson Conrad (vocais e violão).
Charles Gavin:
"Artistas vão embora, as bandas se desfazem, mas a música fica"
Músico e pesquisador comenta o projeto Primavera nos Dentes,
que regravou Secos & Molhados
Escrito por André Felipe de Medeiros, para o site Monkeybuzz (30/08/2017)
Quando Charles Gavin falou ao Monkeybuzz sobre o projeto Primavera nos Dentes, o site já havia preparado terreno para o projeto - que regravou em modo 2017 o repertório da icônica Secos & Molhados - com dois artigos anteriores, um sobre a banda de Ney Matogrosso e outro sobre o próprio disco, lançado no último 18 de agosto. Por isso, nossa conversa por telefone teve o papel de ouvir em suas palavras sobre o processo de formação do novo grupo, assim como - e principalmente - o de reapresentar essas músicas ao público de hoje, em um ponto de vista pessoal do baterista e pesquisador sobre o tempo e a relevância dessa obra no contexto atual.
Quem ouviu o álbum Primavera nos Dentes bem sabe que suas faixas trazem aquelas composições que já conhecemos desde sempre em uma estética bastante contemporânea (aquela beleza de Pós-MPB) que adorna O Patrão Nosso de Cada Dia, Rosa de Hiroshima e outras canções enraizadas no repertório popular de quem nasceu e cresceu por aqui. Se a decisão de regravá-las veio “com toda a certeza”, nas palavras de Charles, o modo com que isso aconteceu foi bastante complexo. “Pegar um repertório desses como matéria prima não é algo fácil de se fazer”, explica ele, “a gente podia errar feio a mão”.
A escolha de gravá-lo veio como resultado de um processo muito anterior ao lançamento, que tem a ver com a época em que o músico desligou-se do trabalho com a banda Titãs. “Eu não estava bem em 2009, estava muito desgastado da estrada, a gente já vinha emendando discos com turnês e shows, e eu não estava bem de cabeça, confesso a você, eu precisava dar um tempo”, conta ele, “foi difícil me afastar, fiquei três anos sem tocar bateria. Foram três anos meio sabáticos quando fui me dedicar a outras coisas” - dentre elas, seu trabalho como pesquisador da diversidade musical produzida no país. “Eu pensava “quando é que eu vou conseguir voltar para os palcos?’”, relembra, “o objetivo [com um novo projeto] era poder voltar aos palcos”.
Regravar a obra de João Ricardo, Ney Matogrosso e Gérson Conrad veio como resposta ao questionamento “Qual música é relevante para mim e para minha geração, que está no meu DNA?”, ele comenta, o que foi fundamental na hora de iniciar um novo projeto. “Esses discos são a música clássica popular brasileira”, segundo ele, “ao lado de Os Mutantes, Novos Baianos, Gil, Raul Seixas, Rita Lee, Caetano, enfim. São discos atemporais, eles continuam relevantes após duzentos anos. E aí foi muito óbvio o caminho que se apresentou: Vamos recriar esse repertório icônico e emblemático”.
“Se é relevante para mim, que sou de 1960, e é relevante pra Duda, que vai fazer 24 anos daqui alguns dias, é relevante para muita gente. Os artistas vão embora, as bandas se desfazem, mas a música fica. A poesia é tão atual e os arranjos… eles são clássicos. Se alguém coloca essa música no rádio, automaticamente todo mundo fala ‘caramba, que coisa incrível, que bom ouvir essa música’. E a pessoa está familiarizada com a poesia. Ela pode não conhecer o nosso arranjo, mas vai saber cantar a letra. Isso ajuda uma relação de cumplicidade nos shows”.
Na hora de gravar, a palavra de ordem, conta o músico, era ter prazer no desafio de encontrar seus novos caminhos, priorizando a originalidade - “para cada música, a gente teve a preocupação de não se parecer com nada”. Com isso, referências a ritmos tipicamente brasileiros, como o Carimbó e o Coco, encontraram inspirações em vertentes do Rock (sobretudo Indie e Punk) e até mesmo Fiona Apple, o que resultou em uma sonoridade que reforça o caráter contemporâneo que as letras possuem.
Para Charles, nossa época é marcada “pela falta de perspectiva”. “Nos anos 1970, a perspectiva era ruim. Uma ditadura militar, uma sociedade conservadora e repressora, e aí vieram Os Mutantes, Novos Baianos e Secos & Molhados para quebrar ‘aquela caretice’, como disse Rita Lee. No nosso caso, vivemos uma ausência total de perspectiva. E esse resgate tem a ver com esse momento político, em que todas as estruturas desabara. Não tem fundo esse buraco, estamos sendo completamente ignorados por Brasília. Por muito menos, a gente estava na rua um ano e meio atrás, como é que a gente não está na rua agora com tudo o que está acontecendo?”.
“Eu penso bastante nessa visibilidade que eu tenho”, comenta ele, “em uma hora como essa em que a gente se lança sobre uma obra como [a da banda], isso provoca coisas. A gente transforma um sentimento negativo, a falta de perspectiva, em um prazer de tocar e de ouvir música”. Para além de instigar o pensamento através da poesia e da música, Primavera nos Dentes cumpre bem seu propósito de reapresentar um capítulo da música brasileira a uma nova geração. “Recebi uma mensagem no Facebook esses dias de um senhor que dizia ‘muito obrigado por apresentar Secos & Molhados aos meus filhos’. É uma responsabilidade que não se pode ignorar”, conclui.
André Felipe de Medeiros
Barbieri Comenta: Este trabalho é sem dúvida um trabalho muito bom mas, convenhamos, não deixa de ser um álbum de covers! Na entrevista acima citar o trabalho de Rita Lee como grande referência da música brasileira é à meu ver forçar a barra. Desde quando uma grande vendagem é 100% sinal de talento! Bom, só posso dizer que no caso aqui da banda Secos & Molhados definitivamente é! Muito embora o caro Charles Gavin venha de uma banda histórica (Titãs), outra coisa que me causou desconforto foi ele afirmar que este trabalho seja rock no senso da palavra e ainda mais querer afirmar que tenha uma influência punk. Está claro que este trabalho está mais para um MPB/POP com momentos bem pasteurizados de rock pesado. Agora citar influência de ritmos como Carimbó e o Coco é brincadeira! Eu aceitaria se a banda tivesse alegado que escutou um pouco da fase mais recente e eletrônica de David Bowie ou escutado um pouquinho de Brian Eno. Bom, sugestão, adoraria de ver esta ideia aplicada aos trabalhos de músicos como Raul Seixas, Tim Maia ou Jorge Benjor. Tendo dito isto, achei este trabalho excelente e tenho certeza que o mesmo sobreviverá muito bem, dispensando qualquer tipo de tentativa de explicação. Desde já fico feliz em saber que este lançamento conseguirá possivelmente ir mais longe do que muitos lançamentos atuais porque, cá entre nós, seus músicos são mais conectados, Charles Gavin tem uma longa história e principalmente porque as músicas já fazem parte de grande parte do inconsciente coletivo de muitos dos brasileiros.
Antonio Celso Barbieri